sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

Momento
Helena Kolody

O anjo da morte estendeu
Suas asas de sombra.

Cessou a pulsação das horas.
A maré da eternidade
Cresceu em silêncio.

quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

Ilusão
Luna

Serão teus os caminhos pressentidos
pela ondas do cálido verão.
Dormentes são as horas quando
em vão,
te espero na poeira das estradas
o sol dedilhando a cabeleira
dos salgueiros
e minha alma cansada.
Serão tuas as formas das areias
que o vento modelou na noite escura
enquanto eu te esperava em vão
pelas estrelas...
Fantasia
Luna

Esta noite vou pescar
eu e o meu samburá
minha rede e meu anzol
levo também dois amigos
um esquilo e um caracol
quero estrelas procurar
no mar
alguns cavalos marinhos
e umas gotas de luar...

quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011





















Mors-Amor
Antero de Quental

Esse negro corcel, cujas passadas
Escuto em sonhos, quando a sombra desce,
E, passando a galope, me aparece
Da noite nas fantásticas estradas,

Donde vem ele? Que regiões sagradas
E terríveis cruzou, que assim parece
Tenebroso e sublime, e lhe estremece
Não sei que horror nas crinas agitadas?

Um cavaleiro de expressão potente,
Formidável, mas plácido, no porte,
Vestido de armadura reluzente,

Cavalga a fera estranha sem temor:
E o corcel negro diz: "Eu sou a Morte!"
Responde o cavaleiro: "Eu sou o Amor!"

terça-feira, 22 de fevereiro de 2011



Eu quero mesmo é alguém me faça mudar
completamente de opinião.
Que faça meu corpo querer companhia nos
momentos em que minha mente insiste pela solidão.

(Caio Fernando Abreu)
Dentro daquela saudade que não ia embora
por mais que o tempo passasse e dentro dele,
mesmo sem lembrar, apenas agindo, todos os
dias eu acordava e tomava banho, escovava os
dentes e fazia todas essas coisas rotineiras,
igual a alguém que aos trancos, mecanicamente,
continua a viver mesmo depois de ter perdido
uma perna ou um braço.

(Caio Fernado Abreu)

segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011





















Intimidade
Antero de Quental

Quando, sorrindo, vais passando, e toda
Essa gente te mira cobiçosa,
És bela - e se te não comparo a rosa,
E que a rosa, bem vês, passou de moda...

Anda-me às vezes a cabeça a roda,
Atrás de ti também, flor caprichosa!
Nem pode haver, na multidão ruidosa,
Coisa mais linda, mais absurda e doida.

Mas e na intimidade e no segredo,
Quando tu coras e sorris a medo,
Que me apraz ver-te e que te adoro, flor!

E nao te quero nunca tanto (ouve isto)
Como quando por ti, por mim, por Cristo, Juras
- mentindo - que me tens amor...

Evadir-me, esquecer-me, regressar
À frescura das coisas vegetais,
Ao verde flutuante dos pinhais
Percorridos de seivas virginais
E ao grande vento límpido do mar.

Sophia de Mello Breyner Andresen