terça-feira, 31 de maio de 2011


À Solidão
Juan Ramón Jiménez,

Solidão coroada de rosas, quem pudera
aprisionar teu corpo de sol e de harmonia;
estar dentro de ti toda esta primavera
de sangue, e folhas secas e de melancolia!

Que palpitasse, em sonho, teu coração sonoro
sobre o meu coração sequioso de ideais;
minha palavra fosse uma palavra de ouro
de teus inesgotáveis e puros mananciais!

Ai! Quem, iluminando a sombra alucinada
que de espinhos coroa minha pálida tristeza,
pudesse ser teu amor, oh deusa coroada
de rosas, solidão, — tu que és mãe da beleza!

sábado, 28 de maio de 2011

Torre Azul
Mario Quintana

É preciso construir uma torre
- uma torre azul para os suicidas.
Têm qualquer coisa de anjos esses suicidas voadores,
qualquer coisa de anjo que perdeu as asas.
É preciso construir-lhes um túnel
- um túnel sem fim e sem saída
e onde um trem viajasse eternamente
como uma nave em alto mar perdida.
É preciso construir uma torre...
É preciso construir um túnel...
É preciso morrer de puro,
puro amor!...

terça-feira, 24 de maio de 2011

Catástrofe
Mario Quintana

O meu esporte único é a Luta corpo a corpo
com o meu Anjo da Guarda.
Lutamos tanto pelo que queremos
Que no final ficaremos redondamente mortos no chão,
Para maior alívio de Nosso Senhor,
Para sempre livre de nós dois!

Eu quero um cacho de beijos
pra levar pra minha irmã
e também um que de nuvens
para a minha gatinha anã.

Roseana Murray
O Antinarciso
Mario Quintana

Esse estranho que mora no espelho
(e é tão mais velho do que eu)
olha-me de um jeito de quem
procura adivinhar quem sou.
O teu amor me deixa cega
e o que me guia neste mundo
são as emoções que sinto por você.
Cada batida do coração é uma seta pro caminho.
Tum... Siga! Tum... Siga! Tum... Siga!

Helô Strega

domingo, 22 de maio de 2011

Exame de Inconsciência
Mario Quintana

Há noites em que não posso dormir
de remorso por tudo o que deixei de cometer...
Canção Para Uma Valsa Lenta
Mario Quintana

Minha vida não foi um romance...
Nunca tive até hoje um segredo...
Se me amas, não digas, que morro
De surpresa... de encanto... de medo.

Minha vida não foi um romance...
Minha vida passou por passar.
Se não amas, não finjas, que vivo
Esperando um amor para amar.

Minha vida não foi um romance...
Pobre vida... passou sem enredo...
Glória a ti que me enches a vida
De surpresa, de encanto, de medo.

Minha vida não foi um romance...

Ai de mim... já se ia acabar!
Pobre vida que toda depende
De um sorriso... de um gesto... um olhar...










Canção Ballet
Mario Quintana

Ele sozinho passeia
Em seu palácio invisível.
Linda moça risca um riso
Por trás do muro de vidro.

Risca e foge, num adejo.
Ele pára, de alma tonta.
Um beijo brota na ponta
Do galho do seu desejo.

E pouco a pouco se achegam.
Põem a palma contra palma.
Mas o frio, o frio do vidro
Lhe penetra a própria alma!

“Ai do meu Reino Encantado,
Se tudo aqui é impossível...
Pra que palácio invisível
Se o mundo está do outro lado?”

E inda busca, de alma louca,
Aquele lábio vermelho.
Ai! o frio da própria boca!
O amor é um beijo no espelho...

Beija e cai, como um engonço,
Todo desarticulado...
Linda moça, como um sonho,
Se dissipa do outro lado...
Te Vejo
Bruno de Paula Campos Jr.

Fiz dos meus Sonhos,
Campos e Jardins
Dos Pensamentos uma Janela,
De onde te vejo passar
E a saudade calar.
Criança
Bruno de Paula Campos Jr.

Hoje acordei com uma vontade ...
Vontade de ser Criança,
Andar descalço,
Brincar de roda,
De ser feliz !

sábado, 21 de maio de 2011

Não me defina pelo meu perfil,
o que você vê e conhece
é apenas um ângulo,
um ponto de vista ou a vista de um ponto meu.
Sou muita mais ou muito menos do que você imagina.
Tente explorar todas as minhas faces,
todos os outros ângulos que ousam insinuar quem sou.
Então, depois não tire conclusões.
Sugiro que formule apenas, algumas hipóteses sobre mim.
Já vou avisando estou sempre em mutação,
não passo de ângulos, verdades e certezas provisórias.

Helô Strega
É a leitura minha grande redentora,
desta realidade tão cheia de caminhos fechados.
Ela é a chave que me permite ir a lugares
que meus pés não chegam.
Esta chave eu darei a todos que puder,
porque definitivamente nada é tão triste,
como não ter para onde ir.
Que cada um tenha o direito a esta chave
e com ela abra os portais que quiser.
Onde visitei os caminhos de Dom Quixote,
hoje penso em conhecer os Maias
e amanhã acho que vou conhecer o poeta Passarinho.

Helô Strega

quinta-feira, 19 de maio de 2011

Rua
Cecília Meireles

Procuro a rua
que ainda me resta:
é longa, é alta,
não é essa.

Esqueço o nome,
por sono ou pressa:
é alta, é clara,
mas não é esta.

Em cada esquina
havia festa:
é clara, é vasta,
não é essa.

Nunca me lembro
onde começa:
é vasta, é longa,
mas não é esta.

Rua que não
se manifesta:
é longa, é alta.
Não é essa.

terça-feira, 17 de maio de 2011

Verbo Ser
Carlos Drummond de Andrade

Que vai ser quando crescer?
Vivem perguntando em redor. Que é ser?
É ter um corpo, um jeito, um nome?
Tenho os três. E sou?
Tenho de mudar quando crescer? Usar outro nome, corpo e jeito?
Ou a gente só principia a ser quando cresce?
É terrível, ser? Dói? É bom? É triste?
Ser; pronunciado tão depressa, e cabe tantas coisas?
Repito: Ser, Ser, Ser. Er. R.
Que vou ser quando crescer?
Sou obrigado a? Posso escolher?
Não dá para entender. Não vou ser.
Vou crescer assim mesmo.
Sem ser Esquecer.
Dança aí junto ao mar;
Que te importa
O rugido da água, o rugido do vento?
Sacode a tua cabeleira
Molhada de gotas de sal;
Tu que és tão jovem ignoras
O triunfo do néscio, não sabes
Que o amor mal se ganha e logo se perde,
Nem viste morrer o melhor operário
E todos os feixes por atar.
Por que hás-de temer
O terrível clamor dos ventos?

William Butler Yeats
Descrição
Cecília Meireles

Há uma água clara que cai sobre pedras escuras
e que, só pelo som, deixa ver como é fria.

Há uma noite por onde passam grandes estrelas puras.
Há um pensamento esperando que se forme uma alegria.

Há um gesto acorrentado e uma voz sem coragem,
e um amor que não sabe onde é que anda o seu dia.

E a água cai, refletindo estrelas, céu, folhagem...
Cai para sempre!

E duas mãos nela mergulham com tristeza,
deixando um esplendor sobre a sua passagem.

(Porque existe um esplendor e uma inútil beleza
nessas mãos que desenham dentro da água sua viagem
para fora da natureza,

onde não chegará nunca esta água imprecisa,
que nasce e desliza, que nasce e desliza...)

segunda-feira, 16 de maio de 2011

“Sou como você me vê…
Posso ser leve como uma brisa,
ou forte como uma ventania,
depende de quando, e como você me vê passar!”

Clarice Lispector

domingo, 15 de maio de 2011

Soneto
Nuno Júdice

Lábios que encontram outros lábios
num meio de caminho, como peregrinos
interrompendo a devoção, nem pobres
nem sábios numa embriaguez sem vinho

que silêncio os entontece quando
de súbito se tocam e, cegos ainda,
procuram a saída que o olhar esquece
num murmúrio de vagos segredos?

É de tarde, na melancolia turva
dos poentes, ouvindo um tocar de sinos
escorrer sob o azul dos céus quentes,

que essa imagem desce de agosto, ou
setembro, e se enrola sem desgosto
no chão obscuro desse amor que lembro.
Havia uma certa ordem naquele tempo.
Sendo verão, chovia às quatro da tarde.
Os pássaros pousavam nos galhos
cantando cada qual sua canção.

É verdade que cães e gatos
continuam obedecendo às nossas ordens
às vezes absurdas
e alguns deitam-se aos nossos pés
e beijam nossas mãos.

Mas havia uma certa ordem naquele tempo.
Um quadrado era perfeito
e um triângulo de três lados
podia chegar à perfeição.
 
Affonso Romano de Sant’Anna


















Passeio no Campo
Florbela Espanca

Meu Amor! Meu Amante! Meu amigo!
Colhe a hora que passa, hora divina,
Bebe-a dentro de mim, bebe-a comigo!
Sinto-me alegre e forte! Sou menina!

Eu tenho, Amor, a cinta esbelta e fina...
Pele doirada de alabastro antigo...
Frágeis mãos de madona florentina...
- Vamos correr e rir por entre o trigo!

Há rendas de gramíneas pelos montes...
Papoilas rubras nos trigais maduros...
Água azulada a cintilar nas fontes...

E à volta, Amor...tornemos, nas alfombras
Dos caminhos selvagens e escuros,
Num astro só as nossas duas sombras...
Tarde de Música
Florbela Espanca

Só Schumann, meu Amor! Serenidade...
Não assustes os sonhos...Ah! não varras
As quimeras...Amor, senão esbarras
Na minha vaga imaterialidade...

Liszt, agora o brilhante; o piano arde...
Beijos alados...ecos de fanfarras...
Pétalas dos teus dedos feitos garras...
Como cai em pó de oiro o ar da tarde!

Eu olhava para ti..."é lindo! Ideal!"
Gemeram nossas vozes confundidas.
- Havia rosas cor-de-rosa aos molhos -

Falavas de Liszt e eu...da musical
Harmonia das pálpebras descidas,
Do ritmo dos teus cílios sobre os olhos...

sexta-feira, 13 de maio de 2011

Há uma lua lá fora, cheia, cheia
pios de coruja e grilos na areia
uma fogueira nos espera na montanha
vem comigo olhar a lua
dançar ao redor do fogo
caçar vagalumes ao relento
e ouvir a voz noturna do vento...

Luna
O Gato
Charles Baudelaire
Tradução: Fernando Pinto do Amaral

Lindo gato, vem cá, vem ao meu colo;
Encolhe as unhas dessa pata,
E deixa que eu mergulhe nos teus olhos,
Um misto de metal e ágata.

Quando os meus dedos, à vontade, afagam
O dorso elástico, a cabeça,
E a mão se me inebria de prazer
No corpo eléctrico, a apalpá-lo,

Vejo a minha mulher. O seu olhar,
Tal como o teu, querido animal,
Frio e profundo, fende-nos qual dardo,

E da cabeça até aos pés
Um ar subtil, um perfume perigoso
Nadam em torno do seu corpo.

segunda-feira, 9 de maio de 2011


Vendo o brilho dos teus olhos.
Seguindo o farol do teu sorriso.
Ah! Pra você menino,
eu mudo todo o meu destino.

Helô Strega
Menino
Joan Teixidor
(Tradução João Cabral de Melo Neto)

Todos os jardins se fizeram para ti
e as flores, as pedras.
Não tentes saber mais, contempla
a luz pendurada na árvore.

Quando grande, não te lembrarás
desta paz divina.
Mas uma obscura saudade haverá no desejo
do que agora te sobra.

A realidade rasgou todos os meus sonhos
e preciso costurá-los de novo
um a um...

Luna

terça-feira, 3 de maio de 2011

Horizonte
Roseana Murray

Se eu apagasse a fina
linha do horizonte
será que o céu
cairia no mar?
E as estrelas e a lua
começariam a navegar?

Ou será que o mar
viraria céu
e os peixes
aprenderiam a voar?
Para Mário Quintana
Bruna Lombardi

Onde quer que você
esteja
veja que agora
em algum lugar alguém
chora
porque você foi
embora.

Eu sei que você
continua
por aí nesse universo
achando rima pra verso
com humor e
melancolia
Perplexo feito criança
diante de cada mistério
sua sutil sabedoria
nota coisas tão
pequenas
que outro não notaria

E aqueles que ficaram
por aqui, nessa
passagem,
sentem no céu esse
anjo
que você sempre escondia
e desejam boa viagem.

segunda-feira, 2 de maio de 2011

Todos nós temos nossas máquinas
do tempo.
Algumas nos levam de volta, elas
são chamadas recordações.
Outras nos levam adiante, elas
são chamadas sonhos.”

Desconheço o Autor*
(*Jeremy Irons – Citado na rede
como autor)